Odontologia Preventiva

February 4, 2024

Prevenção no dicionário é conjunto de medidas ou preparação antecipada de algo que visa prevenir, no nosso caso, problemas bucais.

Foi no final do século XIX, que o termo foi incorporado na saúde. No laboratório de Louis Pasteur, com um microscópio, que já havia sido descoberto no século XVII, mas até então menosprezado, foi identificado a existência de microrganismos causadores de doença e possibilitando a introdução de soros e vacinas. Era a Revolução Pasteuriana, que pela primeira vez, identificou que fatores etiológicos até então desconhecidos, eram os causadores de doenças que agora poderiam ser prevenidas, tratadas e curadas.

Mas foi somente na década de 1940 que o termo PREVENTIVISMO ganhou força na saúde, segundo Paim e Almeida Filho (1998). Os Estados Unidos identificou uma crise na medicina, que estava extremamente especializada e fragmentada, o que ocasionava um aumento dos custos relacionados às práticas médicas. Em função disso, surgiram propostas de mudanças no ensino médico, incorporando nele uma ideia de prevenção. Essas propostas serviram de base para uma reforma dos currículos escolares dos cursos de medicina de várias faculdades norte-americanas na década de 1950. Organizações internacionais do campo da saúde aderiram à nova doutrina, que veio a ser chamada de Medicina Preventiva, ocorrendo, então, uma internacionalização dessa proposta.

Isso não é o que vemos ocorrer na Odontologia. Enquanto a medicina pratica a ideia do PREVENTIVISMO desde a década de 50, a Odontologia permanece na sua maior parte atuando no tratamento de doenças e sequelas.

Mesmo que nos cursos de graduação em Odontologia existam disciplinas e temas associados à epidemiologia, saúde coletiva e bioestatística, as práticas individuais ainda estão centradas no tratamento de doenças e sequelas, e pouco na prevenção. Por não fornecer uma visão mais completa do indivíduo, em uma esfera bio-psico-social que até hoje são fragmentadas. A inclusão de disciplinas que abordam a Saúde coletiva e prevenção na grade curricular, sem outros projetos integradores sejam colocados em prática, por si só não são suficientes para formar profissionais que atuem integralmente promovendo saúde, ao invés de apenas vender tratamentos para doenças.

Outro ponto importante é que o ensino ainda é pautado na especialização, o que torna a educação odontológica segmentada e pouco efetiva quando falamos de prevenção de doenças bucais como um todo.

Foi nos anos 2007 até 2010, cursando as disciplinas de Saúde Coletiva que comecei ter alguns pensamentos e reflexões sobre isso. Me perguntando por que vivíamos em um sistema de saúde que tratava doenças e sequelas, se era muito mais fácil e barato agir na prevenção, educação e conscientização da população. Foram muitos "porquês" sem resposta. Por que as campanhas anti-tabaco sumiram, se eram efetivas? Por que um dos países que mais vacinava no mundo, se rebela contra uma arma poderosa capaz de erradicar doenças que antes levavam a morte? Por que não conseguimos implantar um sistema de saúde Preventiva efetivo? Seria o governo? a educação (ou a falta dela)?

Sem muitas respostas, achei que minhas perguntas jamais teriam força para mudar alguma coisa e só me restava me especializar ao máximo em um procedimento de alta complexidade, pois assim eu teria sucesso.

E assim foi o início da minha carreira, foquei na Prótese, me sentia entrando em um funil, cada vez mais especializada, cada vez enxergando menos do resto. Até que a uma certa altura o 'resto' começou fazer falta. Comecei a perceber que saber muito de algo e pouco do resto, me limitava muito ao lidar com um ser humano, que não é apenas um dente, uma prótese, um implante...

E aqueles questionamentos voltaram porém, com mais sentido. E eu então percebi que como especialista que era, meu papel principal era evitar que meus pacientes necessitassem dos meus serviços de especialista. Percebi que não bastava apenas eu fazer próteses com excelência se eu não soubesse trabalhar com o intuito de evitar que meus pacientes precisassem delas. Já que ninguém melhor que eu sabia as perdas que ocorrem no processo, e tudo que viria depois. Assim, trabalhar APENAS tratando sequelas deixou de ser a minha única objetivo... por que bem lá no fundo eu sempre soube qual era meu papel, e sentia que não estava o exercendo minha profissão plenamente.

Foi dando voz para aquilo que eu acreditava que acabei conhecendo outros profissionais levantando a mesma bandeira, entendendo a Odontologia não somente como uma prática curativa e reabilitadora, mas uma oportunidade de promover saúde. Hoje consigo compartilhar com alguns colegas a ideia de que sucesso é ter cada vez mais a agenda cheia de profilaxias e consultas de prevenção, e que esses procedimentos DEVEM ter alta frequência no consultório. É o indicador de que estamos realmente PREVENINDO os problemas bucais em nossos pacientes.

Ando percebendo na odontologia, o que aconteceu na medicina na déc de 50, um pouco tarde mas melhor do que nunca.

Eu continuo apaixonada pela minha especialidade, acreditando na reabilitação, na estética e nas mudanças que elas promovem na vida das pessoas. Mas antes disso, eu acredito na minha capacidade de prevenir e ensinar o meu paciente que podemos escrever um caminho diferente.

Murieli Montemezzo

Cirugiã-Dentista

Esp. em Prótese Dentária

CRO-SC 12131.

Fontes citadas:

https://doi.org/10.1590/S0103-73312007000100003

https://doi.org/10.1590/S0104-12902015S01018

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